Estou só, agora é concreto. Já era só antes e agora definitivamente. O que me resta? Escrever?
Sempre tive esta vontade, de ser escritora, mas isso toma tempo e é necessária muita dedicação, mais transpiração do que inspiração. Sim, é preciso ter o dom, mas sem a disciplina as páginas em branco não são preenchidas.
É claro que escrevo, meu nome é Alicia Dias e tenho 34 anos, sou professora de Relações Internacionais numa faculdade e minha carreira em si exige que escreva. Não me contento em apenas cumprir minha carga horária, gosto de minha profissão, gosto do meu trabalho, por isso faço pesquisa e publico muito. Tenho até dois livros escritos e publicados.
Mas não é disso que estou falando. Queria escrever à alma das pessoas, palavras que quem lesse se sentisse tocado, que inspirasse, quem sabe romances, ou tragédias. Por que não um drama? Talvez virasse roteiro de um filme e eu até tivesse uma noite de autógrafos, desejar é possível, o difícil é concretizar. As vezes me pego pensando nas histórias que vivem dentro de mim. Sim, tenho-as prontas, só preciso da transpiração e disciplina na frente do computador, mas depois desanimo. Também penso que o mais difícil seria encontrar quem as lesse. Histórias sem leitores são como histórias não escritas, elas não existem, não ganham vida, são como se ainda apenas existissem dentro de nossa mente.
Tenho que me decidir, então resolvi agora experimentar. A vida é muito curta, a gente se envolve nos problemas e questões do dia a dia e o resto, o que é importante, o que faz a vida valer a pena, acaba ficando de lado, para depois, então um dia a gente se dá conta de que a vida passou e nos perguntamos: o que fizemos? Fazemos uma retrospectiva dos planos que tivemos para nós mesmos, do que sonhamos viver e descobrimos que tudo foi levado pela dinâmica dos dias, do passar dos dias, das tarefas a serem feitas, dos compromissos, das relações sociais, das obrigações, dos estudos, do trabalho, mas afinal isso é a vida: o fluxo interminável dos dias, um depois do outro. Mas e os sonhos? Os de verdade, os nossos desejos mais profundos, aquela vontade de auto-realização, de se sentir gente, de fazer alguma coisa e no final ter a sensação de que a vida realmente valeu. De dizer: sim é para isso que vivemos! De realizar e se sentir plenos, mesmo que no dia seguinte passe e nos vemos de novo envoltos na rotina dos dias buscando novamente a plenitude.
Não, não vivemos, não fizemos nada disso, não deu tempo porque estávamos ocupados demais levando a vida, fazendo todas as outras coisas que fazemos, que tivemos que fazer e por isso não deu tempo de ter a vida que valesse, nossa vida para valer e quando descobrimos já é tarde, ou não. Não sei.
Isso é só uma inquietação minha. Não sei se todas as pessoas são assim, pensam deste modo, que acreditam nesse fluxo da vida, que vai nos levando: nós trabalhamos, temos férias, cumprimos nossas obrigações, criamos nossos filhos, comemoramos os aniversários, mais um ano passa, trocamos presentes no Natal, celebramos a virada de mais um ano, vem um novo e sonhamos com os novos planos, o que de novo podemos fazer, ou com os velhos não realizados, os projetos para a nova vida que acreditamos estar começando e, então, vivemos mais um ano, um depois do outro. As pessoas são assim, muitas delas, e a vida é isso. Mas para mim não é assim, não consigo que seja assim, penso somente que estou ocupada com todas essas coisas e que minha vida, a de verdade, a que deveria ser, ficou de lado, esperando que eu tenha tempo para vivê-la, para fazer minhas realizações, tudo que foi planejado. Mas quando terei tempo, se mais um ano vem e com eles as obrigações, o trabalho a realizar, as contas para pagar, as compras à fazer, a festa do Natal para preparar e estourar os fogos da virada? Não dá tempo!
Escrever está nessa dimensão da vida, na que eu não consigo viver, na que não tenho tempo, na que sinto que vai me engrandecer e me fazer pensar que a vida valeu a pena. Por isso me dou conta que preciso me expressar, portanto agora decido que darei vida ao que tenho a escrever e conseguindo que pelo menos uma pessoa leia, quem sabe um amigo bem próximo, não sei, mas o primeiro passo é escrever. Isso só depende de mim.
O difícil é olhar a folha em branco e pensar no tanto de trabalho pela frente, mas será um trabalho com prazer, que vai me preencher, me engrandecer e fazer a vida valer realmente a pena. Será a minha vida de verdade. As histórias já vivem dentro de mim, preciso dar-lhes vida, deixá-las seguir seu curso e entregá-las ao mundo, o seu destino. Seja lá qual ele for.
Quando penso nisso tudo, que vivo de fora da vida que queria para mim, da vida que deveria ser a minha, aquela em que os meus sonhos e projetos são executados, aqueles que pelo qual realmente vale uma vida, que vale viver, acredito que não sou eu que estou aqui vivendo os meus dias e sim uma personagem qualquer que estou representando. Essa que acorda todo dia e anda por aí cumprindo as obrigações não sou eu, não é a alma que mora em mim, ela está adormecida esperando a hora em que vou parar de atuar, de representar numa vida que não é a minha de verdade para acordar e começar a viver.
Foi por isso que decidi começar a escrever por esta estória, a dessa personagem que venho representando por tanto tempo. É com ela que começarei a escrever, para me libertar dessa vida falsa. Uma vez iniciado o trabalho de escrever sinto que entrarei na minha vida de verdade, darei ao mundo, libertarei essa personagem representada e poderei recuperar quem realmente sou, a verdadeira eu e viver a minha história. Como a personagem está aqui, vivendo o fluxo dos dias, nos acontecimentos reais nada mais próprio que este blog que também é fluído e segue como a corrente dos dias.
Isso tudo me ocorreu hoje porque acabo de voltar do enterro de minha mãe... Me dei conta do quanto a vida pode ser frágil, curta e que a minha pode chegar ao fim um dia. E vai chegar, não sei quando será e não vou ter tido tempo de viver o que realmente sou. É preciso, portanto, vivê-lo, ou tentar pelo menos despertar o que realmente sou. Preciso começar...
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